É no cansaço
reclinado de uma noite como esta
Que se acendem
estados de ser, de respirar,
Do sentir, da
saudade e do que se sonha.
Sempre do que se
sonha. Sempre do que se
deseja.
Como se não fosse pecado.
Como se infames
não fossem as palavras mudas que ouso sibilar
No regaço do teu
corpo ausente, aniquilado, ébrio de mim.
Ainda que de castas
se pintem. Ainda que em lilazes me acariciem a fronte,
Sei o acre do
beijo envenenado que em ânsias me depositam.
Adornam-me o
pensamento com ciosas ideias baloiçantes.
Incendeiam-me os
olhos gastos do contemplar de eternidades.
Choro tanto que é
comum convencer-me que de lágrimas me faço.
De mim tanto irrompe
em catadupa que temo pela essência do Cerne.
É pertinente
considerar que os homens são de prantos recheados.
Se assim o não é,
onde se afogam os cantos de cada madrugada?
Vagueiam ainda
perdidos na sombra decadente dos âgulos esguios?
Pairam dias sem
fim aguardando pelo mar da torrente nocturna?
Capturam poros
imaginários inócuos, sonham sonetos antigos
Sentidos há
muitos, muitos anos, antes das formas se saberem formas?
Lambem de ímpeto
as suspensas cobranças da loucura perene, prenhe
De cadências
derramadas em cálices de sangues sagrados, chagas infinitas,
Negras e
prateadas do luar desta noite reclinada na amplitude
Do descomunal
esforço de te não pensar.
E desperta-se
para a ignóbil e férrea fé da espectação em sombras siamesas das sombras
nossas.
Maria Fernandes, in Contemplações, Constatações e 30 Ventos (2015)