domingo, 27 de janeiro de 2013

Da Palavra Assassina



Como se escreve o que se não pensa, o que se nos estravasa a lucidez?
Como compor em palavras cognoscências cósmicas?
Se não sei escrever mais do que o que penso
E me encontro, não raras vezes, em coma sináptico
Buscando algo, algo só.
Talvez me tenha acabado a vida que possa esboçar.
Talvez não conheça mais conceitos e observam-me
Os olhos dos que me não vêem , nem me sentem, nem me cheiram.
E o meu nome não ecoa em sítio nenhum, nem faz esboçar sorrisos.
Pensar a infinitude já me não satisfaz, já me não preenche.
Quero agora a nanoexistência invisível de se misturar em moléculas
Do querer, em ardor, ser toda palavra, toda linguagem, toda ideia.
O nylon que entre o dedos me vibra rasgando acordes que
Não sei articular e quero-os abarcar em mim e quero-lhes
Mudar o nome e a face para uma outra forma de arte, a dos
Inquietos e insanos que se auto-instruem do conhecimento
Que se sabe, enfim, enganou o mundo e os homens do mundo.
Saber ser, saber o saber, ser o saber. Escrevê-lo na convicção
De que nada mais é digno de ser pensado, reproduzido, lembrado.
E é quando se olha por cima do ombro e já nem sombra se tem.
E é quando algum vago auto-reflexo nos fita impunes e nos cala
De súbito a vã oração da lei cósmica, que loucos vamos balbuciando
Em cada virar de esquina, e sabemos que do pensar nasce a palavra.
E que esta em nós renasce.
 E que esta em nós mata.


Maria Fernandes, in Contemplações, Constatações e 30 Ventos (2015)

1 comentário:

  1. Seus poemas são lindos. O fio de sua angústia não perde o fio de suas palavras e a poesia se faz forte e tocante. Também escrevo poemas, quando puder, dê uma olhadela.

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