domingo, 25 de novembro de 2012

Psico-Ode da Mulher Apaixonada

E eis que desperto das procelosas vagas da minha aurora.
O ar quente de uma brisa suave traz-me o leve susurro desse nome em surdina. Não existem palavras que descrevam o meu estado no últimos dias. E noites. Esta é a oitava desde que a cosmicidade se consumou na inevitável rendição a que desde imemoráveis eternidades estava conjurada. Por teias do ser e não estar, do estar e não ser, a amar ainda assim, coisas-marianas, di-se-ia. Ah! - e como me perco em tudo o que debito! Ainda que desfrute do prazer esquecido do lápis no papel, redescoberto numa fase já avançada da  decomposição. E como amo a terra e as bases e todo o que é básico, elementar, puro, sem brioches de enfeite nem lantejoulas tagarelas.
No fundo, a ideia de que pelo caminho, a certa altura deixei de ser quem era ou me esqueci de ser quem era. A sensação de que não quis ser quem era mas não quis ser ninguém, nem nada. Quis ser eu sem saber quem era a mulher do reflexo. Quis ser eu, sendo outra, a desconhecida, a nunca-nomeada, a desalmada esbaforida, a mulher apaixonada.
Ou então nunca fui eu nem Eu, nem esta, nem aqueloutra. De maneira que esta que hoje em palavras definha pontapeia ainda em fúria o saco amniótico da solidão assassina.
Ainda que em mim te traga sem te poder alcançar. Ainda que em nenhum corrimão se dependurem as palavras que te falem da grandeza que é deste leve e ígneo âmago de mim, que o mesmo não é desde que o amas. Flutua, agora, paira suave pelos restícios de todas as noites em que adormeço na linha do teu corpo.
Agora, verto as ânsias de te mastigar no íntimo. Arremesso as odes todas que nasceram em sonhos nenhuns. Agora, nem uma palavra que console a leda alma. Agora, olho ao espelho com espanto a mulher intermitente, insistente, mordaz, furiosa, acutilantemente bravia e apaixonada.


Maria Fernandes

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